"(...) as realidades mais óbvias, onipresentes e fundamentais são com frequência as mais difíceis de ver e conversar a respeito. Dito dessa forma, em uma frase, é claro que isso não passa de uma platitude banal, mas o fato é que nas trincheiras cotidianas da existência adulta as platitudes banais podem ter uma importância vital, ou pelo menos é o que eu gostaria de sugerir a vocês nessa manhã de tempo seco e agradável." (David Foster Wallace, "This is water", 2005)

domingo, 12 de abril de 2015

Está sempre bêbado de amor

Ainda Rumi, também através da versão em inglês de Shahram Shiva.

O Amante está sempre

bêbado
     de
          amor.

Ele é louco
ela, livre.

Ele canta com
     prazer

ela dança em
     êxtase.

Enquanto nós, presos
em nossos próprios
     medos
nos preocupamos
com tudo.

Mas uma vez

bêbados
     de
          amor

o que tiver
de
ser
será.

sábado, 11 de abril de 2015

Pensas que viver é apenas respirar?

Outro Rumi, a partir da versão em inglês de Shahram Shiva.

Pensas que viver
é apenas

respirar?

Lamento que tua vida
seja assim tão

limitada.

Não fiques sem amor

ou te sentirás

na morte.

Morre tu em amor
e assim vives para sempre.

domingo, 8 de fevereiro de 2015

Não desista da solidão tão rápido

Mais poesia persa. Agora, Shams al-Din Hafiz Shirazi (séc. XIV), em versão minha a partir desta versão em inglês.

Não desista da solidão tão
     rápido.

Deixe que ela
     corte
          mais
               um pouco.

Deixe que em você
ela fermente
e amadureça
como poucos elementos
     humanos
     ou
     divinos
          podem fazer.

Esta noite
meu coração
sente falta de algo

que fez
meu olhar suave
minha voz terna

minha
     necessidade
          de Deus
absolutamente
     clara.


sábado, 7 de fevereiro de 2015

Deixe que o amor seja

Outra tradução de Rumi, a partir da versão de Coleman Barks.

Deixe que o amor seja

desgraçado
louco
perdido.

Alguém sóbrio
-ao contrário-
se preocuparia
se as coisas
não vão
bem.

Mas deixe que
o amor
seja.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Amarga constatação

Eleições domingo, e a desalentadora notícia de que os mais reacionários estão dentre os mais lembrados para a Câmara. A fascistização está no ar: a esquerda e movimentos sociais atacados nas "jornadas de junho" de 2013, candidatos a presidente -reparem, o cargo máximo da República- vociferando os discursos mais homofóbicos e atrasados. Enquanto isso, o famigerado art. 46 da lei 9.504 retira o direito de partidos como o PCB, PSTU e PCO participarem dos debates televisivos.

O brasileiro é conservador, e isso é evidente. A imagem de tolerância, carnavalesca, do povo receptivo e solidário é apenas um estereótipo. O trombadinha é espancado por "populares" na Rua do Rosário, sob a janela do meu escritório, e todos param para ver e aplaudir; alguns para aproveitar e dar uma porradinha também, é claro, e todos saem satisfeitos com a justiça feita. Afinal, se as autoridades nada fazem, "nós" faremos; mas o afã "justiçador" tem por alvo o trombadinha descalço e esquálido, enquanto o megaempresário passa incólume, aliás, o que um homem de bem poderia fazer de mal? Porrada no menino negro, loas ao engravatado de olhos azuis.

O relógio roubado pelo trombadinha: cem reais, digamos. O prejuízo causado pelo empresário: quase um bilhão e meio de reais. Mas o ódio "justiçador" da turba é seletivo. O fascismo ganha as massas. Eleições domingo, e quem viver verá.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Dançar é preciso, viver não é preciso

O clérigo xiita kuwaitiano Yasser Habib, à pergunta se é ilícito cantar ou tocar música:

Singing as well as playing music is a trap of Shaytan and a window through which he can get access to his soul and heart and lead him to desire, both of which are forbidden.

Uma interpretação que não fala pela religião inteira, evidentemente, mas que interpretação! Evoca um cenário desolado e sombrio. Eu penso justamente o contrário- a música é estar em contato com a divindade e, como diz Garaudy, toda tentativa de falar com Deus (theo, logos) é poética, do Ramayana aos poemas de São João da Cruz.

"Se eu não posso dançar não é minha revolução" (If I can't dance I don't want to be in your revolution), diz a frase supostamente atribuída a Emma Goldman. É isso mesmo: dançar é direito inalienável, e revoluções e religiões sem dança são coisas muito chatas.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

“Concurso público é uma máquina de injustiça social”

Na mosca:

O concurso público hoje é uma máquina de exclusão social, e não de inclusão. Esse sistema é voltado para quem tem tempo e dinheiro para pagar um bom cursinho. Pra quem pode pagar um bom colégio, que já no ensino médio ministra disciplinas para preparar o seu filho para os concursos da administração pública. Esse é um dos reflexos perversos da ideologia concurseira. Pra fazer cursinho, você precisa ter tempo. E ter tempo é poder não trabalhar.

Íntegra aqui.

Coincidentemente, o post da última sexta no Nova Dialética cita a deficiência dos concursos públicos no Brasil: um festival de pegadinhas e "macetes", enriquecendo cursinhos e enchendo o ego de membros de bancas.