"(...) as realidades mais óbvias, onipresentes e fundamentais são com frequência as mais difíceis de ver e conversar a respeito. Dito dessa forma, em uma frase, é claro que isso não passa de uma platitude banal, mas o fato é que nas trincheiras cotidianas da existência adulta as platitudes banais podem ter uma importância vital, ou pelo menos é o que eu gostaria de sugerir a vocês nessa manhã de tempo seco e agradável." (David Foster Wallace, "This is water", 2005)

terça-feira, 4 de junho de 2013

A LIT e a Síria, rápido comentário

Nesta declaração (aqui), a LIT- Liga Internacional dos Trabalhadores, assim se posiciona sobre os eventos na Síria:

A LIT-QI, desde o início da revolução, expressa um apoio sem condições à revolução síria, independentemente de sua direção, e sustentamos que a bandeira central dos ativistas e lutadores/as honestos/as e da esquerda deve ser, mais que nunca: Fora Assad, não à intervenção imperialista e sionista! Todo apoio para o triunfo da revolução!

O grifo é meu. "Independentemente de sua direção", ora, que temeridade dizer algo assim! Cai em contradição quando diz, a seguir, "não à intervenção imperialista e sionista". Afinal, se não importa o caráter da direção, ser imperialista ou sionista é mero detalhe. Ou é apenas uma confusão retórica? Mas não fica nisso. Vejamos, ainda:

Neste sentido, é necessário exigir de todos os governos do mundo, começando por aqueles países da região que são parte da revolução, como Egito, Tunísia ou Líbia, que rompam relações diplomáticas e comerciais com a ditadura de Assad e que enviem aviões, tanques e armas pesadas, medicamentos, alimentos e todo tipo de apoio material para as milícias rebeldes, para que estas possam derrotar e acabar com este regime que oprime o povo sírio e que mostrou ser uma garantia fiel dos interesses de Israel e dos Estados Unidos.

A primeira pergunta que se faz: a quem exatamente a LIT faz o apelo? A "todos os governos do mundo", que não sigam os interesses de Israel e EUA. A dificuldade já nasce aí. A LIT faz apelo a algum Estado Operário? Mas salvo Cuba e Coréia do Norte, essa sob degeneração gravíssima, já não há Estados Operários, e a LIT sequer os reconhece como tal. E os países que tensionam com os EUA, como Venezuela e Irã, também não nutrem a simpatia dos morenistas. A pergunta fica em aberto: quem virá ao socorro dos "rebeldes" sírios? O texto cita nominalmente Egito, Tunísia e Líbia, mas tais países estão sob a chancela da OTAN ou em tensão com o poder militar, de modo que não são aptos para oferecer ajuda. Seriam, caso a classe trabalhadora desses países não tivesse sido alijada do processo. A "revolução do Nilo" foi um movimento popular que, em dado momento, foi encampado pelo imperialismo internacional, derrubando ele próprio seus aliados -de Kadafi a Mubarak- que já não serviam. A falta de uma direção revolucionária -lembremos o "Programa de Transição"- impediu que se chegasse a uma situação, de fato, revolucionária.

Quem ajudaria, então? A União Européia..? Pano rápido.

Ah, sim, usei aspas para "rebeldes". A própria LIT, no texto indicado, reconhece as contradições envolvidas no processo (inclusive a disputa sectária religiosa, conforme Robert Fisk lembra neste texto). "Rebeldes", aqui, inclui sionistas e imperialistas, o Exército Livre da Síria, milícias islâmicas, setores da classe trabalhadora síria. É complexo. Muito. Mas para a LIT, não importa quem está na direção!

Leon Trotsky, em "Combater o imperialismo para combater o fascismo", de setembro de 1938, escrevia:

Realmente, pode alguém acreditar, por um momento sequer, que Chamberlain, Daladier ou Roosevelt são capazes de declarar uma guerra para defender o princípio abstrato da "democracia"? Se o governo britânico amasse tanto a democracia, teria dado a liberdade à Índia. E o mesmo com a França. A Grã-Bretanha prefere a ditadura de Franco na Espanha à dominação política dos operários e camponeses, porque Franco pode ser um agente do imperialismo britânico muito mais complacente e de confiança.

A LIT dirá que Assad, justamente, está no papel de Franco. Mas isso não explica porque os EUA e o sionismo (também) querem derrubá-lo. É o atoleiro de contradições onde a LIT se enfiou.

Um comentário:

  1. E aí, J.L., como vai? Gostei muito de algumas coisas que li aqui no teu blog, compartilhamos de algumas mesmas ideias. Voltarei mais vezes, um abraço!

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