"(...) as realidades mais óbvias, onipresentes e fundamentais são com frequência as mais difíceis de ver e conversar a respeito. Dito dessa forma, em uma frase, é claro que isso não passa de uma platitude banal, mas o fato é que nas trincheiras cotidianas da existência adulta as platitudes banais podem ter uma importância vital, ou pelo menos é o que eu gostaria de sugerir a vocês nessa manhã de tempo seco e agradável." (David Foster Wallace, "This is water", 2005)

segunda-feira, 27 de maio de 2013

É preciso mais que xingar o prefeito

E eis que Eduardo Paes, cuja saída da prefeitura do Rio é desejo ardente do blog (aqui), se envolve em confusão, dando um soco (!) em um cidadão que lhe xingara de "bosta" (aqui, aqui). O alcaide deveria saber que o homem público (?) está, necessariamente, na berlinda; atrai manifestações e opiniões, muitas vezes desagradáveis. É o preço do cargo e, mais do que isso, o preço das escolhas políticas adotadas. Um prefeito como Eduardo Paes não pode achar que merece tapetes vermelhos por onde anda. Em outros momentos e circunstâncias, aliás, apenas ser chamado de "bosta" seria lucro ("Se essa palhaçada fosse na Cinelândia/ Ia juntar muita gente pra pegar na saída", como cantaram os Paralamas, numa música que depois do lulismo no poder adquiriu tristes cores irônicas).

Há outra coisa, chamada compostura. Elemento indispensável para a vida em sociedade, é exigida ao quadrado do homem, de novo, "público". Como autoridade (!) maior da cidade, Eduardo Paes anda acompanhado de seguranças. As matérias que noticiaram o fato confirmam isso. É fácil a um homem, com um séquito assim, afastar um agressor, de forma, digamos, limpa- sem tumulto ou alvoroço. Mas não. Paes, talvez para mostrar que "é homem", partiu ele mesmo pra cima do sujeito, apesar de garantido por seguranças. Aí já é linchamento. Cercado pelos brutamontes, o cidadão sequer poderia revidar. Cenas lamentáveis, pois, violência-pastelão digna do Rio de Janeiro de Eduardo Paes.

Ah, mas o cidadão tem o direito de xingar o prefeito que, naquela ocasião, era um cidadão em momento privado, jantando com a esposa? Antes de mais nada, o mandato acompanha o político. Não deixa de ser prefeito por estar jantando com a família, e a presença dos seguranças é exemplo disso. Segundo, o mero xingamento, como dito acima, pode mesmo ser pouco, conforme o grau de distensão social do momento. A questão, aqui, é outra: se meramente xingar o prefeito ajuda em alguma coisa. Assim como o terrorismo individual é inócuo para a emancipação da classe trabalhadora (conforme os marxistas denunciamos reiteradamente, vide aqui), esse tipo de protesto é vazio. Afastar Eduardo Paes e os interesses que representa da prefeitura do Rio de Janeiro (o que é apenas uma pequena parcela do problema) requer um amplo trabalho de conscientização das massas (coisa, aliás, de que o "agressor" talvez sequer tenha interesse, pois desconheço sua posição no espectro ideológico). Xingar o prefeito por si só é inútil, portanto. Mas lava a alma, ah, como lava.

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